terça-feira, 17 de março de 2020

Meu encontro com as palavras de Edgar Allan Poe

Trago-lhes uma história. Muitos aqui sabem que um dos meus escritores favoritos, senão o favorito, é Edgar Allan Poe. Um dos meus sonhos é poder visitar seu museu, em Boston, nos EUA, e poder ver de perto um pouco mais sobre essa pessoa que considero extraordinária no campo literário. Hoje, contarei meu encontro com o sr. Poe.


Antes de tudo


Era mais um dia de 2016. Estava se aproximando o fim do ano, devia ser outubro ou novembro, se me recordo corretamente. Como alguns dos leitores talvez saibam, meu gênero musical favorito é o rock progressivo, que também contém minha banda favorita, Pink Floyd. Para minha alegria, na escola em que eu estudava na época, tinha alguns amigos que compartilhavam desse gosto e, na ocasião, um deles, Murilo, indicou-me um álbum de uma banda da qual eu nunca tinha ouvido falar. Tales of Mystery and Imagination - Edgar Allan Poe, de Alan Parsons Project. Foi o primeiro álbum que ouvi pelo Spotify. A capa era bem bonita, dei play na primeira faixa, A Dream Within a Dream. Dali em diante, foram quarenta e poucos minutos de muito encantamento com a qualidade da música que eu estava ouvindo. A propósito, recomendo a todos, é uma música transcendental.

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Versão da capa do álbum como estava no Spotify.

Eu já tinha ouvido falar no nome de Edgar Allan Poe, mas bem por alto, apenas sendo mencionado por aí. Eu sabia que ele era um escritor estadunidense. O que eu só depois percebi é que cada música era inspirada em poemas e contos homônimos dele - o que não era muito difícil de inferir, se eu tivesse me prestado ao trabalho de ler a capa melhor. De fato, eu conheci a obra do mestre Poe não por ele, mas por meios indiretos, o que acentuou mais ainda minha curiosidade por conhecê-lo. Se a música baseada em sua literatura era tão boa daquele jeito, o que eu poderia esperar dos textos em si? Foi então que minha jornada havia propriamente começado. Meu primeiro livro de sua autoria foi o mais modesto possível, era um livro de bolso da L&PM Pocket intitulado "Assassinatos na Rua Morgue e outras histórias". Não me recordo muito bem de como o adquiri, mas creio ter sido comprado algum dia em que eu estava na Escariz e passei pela seção de bolso.

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O livro que começou tudo.

Dezembro caminhava para o seu fim e eu iria passar um fim de semana na casa da minha namorada da época. Quando chegou a noite, fomos dormir em quartos separados, ainda éramos bem jovens. Foi ali que abri pela primeira vez o livro e comecei a leitura. "O demônio da perversidade" foi o conto inicial. Dali em diante, decidi ler um conto por dia - ou melhor, por noite. Havia algo na quietude da madrugada que me convidava a ler aqueles textos. Um estilo narrativo com um teor que combinava muito comigo e com o que eu estava sentindo naqueles dias. Ao mesmo tempo, eu estava terminando de escrever meu segundo livro, e fiz uma menção a Poe no capítulo final. Aquela não seria a última vez que ele me serviria de auxílio ou inspiração.

Desde então, ouvir Alan Parsons Project, tanto o primeiro álbum quanto outros em que me adentrei por curiosidade, como Eye in the Sky, e ler Poe foram dois hábitos que marcaram extensivamente minha rotina do fim de 2016 e do início de 2017. Infelizmente, coisas demais aconteceram nesse curto período, e a felicidade considerável que eu levava comigo deu lugar a uma tristeza acentuada e diversas noites perdidas devido a crises de ansiedade que não sentia há vários meses. A banda e o livro me acompanharam, sim, mas de uma forma diferente, era difícil não chorar quando ouvia as faixas. Era difícil não chorar na maior parte do tempo, também.


Um sonho


O tempo passou e chegou o mês de fevereiro de 2017. Talvez tenha sido fevereiro, talvez janeiro, não me lembro com exatidão. O fato é que eu tinha saído com alguns amigos para o shopping e acabamos parando na Saraiva, coisa que era um costume entre a gente. Lá, uma das pessoas sugeriu que fizéssemos um tipo de amigo secreto: cada pessoa tiraria um nome e deveria procurar um livro na loja que ela achava que a outra iria gostar. De quase nada tenho certeza sobre esse dia, mas me lembro de ter tirado uma menina chamada Mariana, e acho que ela também me tirou. Eu trouxe para ela "Confissões do Crematório", da Caitlin Doughty, porque achei que combinava muito com a personalidade dela. Já ela me trouxe outro livro de Poe, dessa vez um mais elaborado, de capa dura, da editora Darkside, de nome "Medo Clássico - Edgar Allan Poe". Era lindo, eu sabia que o queria assim que o vi. Mariana, você acertou em cheio. Naquele mesmo dia, sem muito hesitar, comprei-o.

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O segundo livro, e o mais importante deles para a presente história.
Aquele livro era incrivelmente poderoso. Tinha algo naquelas páginas, no seu tom amarelado, na tipografia do texto, nas ilustrações, que me saltava aos olhos. Era uma experiência verdadeiramente deleitosa ler aquelas histórias. Continuei com o hábito de ler durante a noite, e o primeiro conto foi o suspense "O Poço e o Pêndulo". Foi uma leitura que me impediu de dormir, sendo bastante honesto. Não exatamente porque dava medo, mas porque havia me deixado intrigado com tanto talento e tão boa construção narrativa. Eu estava me apaixonando por aquele estilo literário, que tanto ressoava com meu coração, parecia estar em sincronia com meus batimentos cardíacos.

O livro era composto basicamente de contos e o clássico poema The Raven (O Corvo), tanto em sua versão original quanto em duas traduções para o português, ambas de escritores igualmente ou mais famosos ainda: Machado de Assis e Fernando Pessoa. O Corvo sempre vai ser a menina dos olhos dos meus poemas favoritos, tanto é que eu sei recitar a primeira metade do poema - ainda preciso aprender a segunda. Pessoalmente, das traduções, eu prefiro a de Machado, mas o público de forma geral gosta mais da de Pessoa. Mas nenhuma delas se compara ao arrepio inicial de se ler "Once upon a midnight dreary...".

Apesar de tudo que me vinha acontecendo, eu sempre encontrava conforto naquelas aparentemente duras e pesadas palavras de Poe, naqueles contos homicidas e sobrenaturais. Houve enorme influência sobre minha própria obra. Até hoje, considero os poemas e contos que fiz em 2017 os mais profundamente tristes e pesados que escrevi em toda a vida, em parte pelo livro de cabeceira e em parte pela minha própria desgraça. Mas os admiro como um ápice de minha breve carreira, sempre os releio e tento imaginar como consegui escrever de forma tão bela.

A banda ainda me acompanha, atualmente me considero um certo fã, tendo ouvido vários de seus álbuns. Indicações aos interessados: The Turn of a Friendly Card e I Robot. Mas, sem dúvida alguma, aquele que sempre ficará dentro de mim de forma mais memorável será Tales of Mystery and Imagination. É uma das composições musicais que mais me dão inspiração, e inclusive é o que estou ouvindo neste exato momento. Ainda naquela época, estudei um pouco sobre a vida e a morte de Poe, e li alguns de seus poemas, os quais não se fizeram presentes nos dois livros já mostrados aqui, além de O Corvo. To One in Paradise continua sendo um dos meus prediletos, mas, até onde pesquisei infelizmente não possui tradução, embora seja bem curtinho.

De lá para cá, tenho colecionado outros livros dele, como o segundo volume do "Medo Clássico" e outras coletâneas, algumas com textos repetidos, outras não. Este parágrafo tem como intuito exaltar minha namorada Nara por ter me dado de presente o livro "Contos de Imaginação e Mistério" - o livro com o título do álbum que me levou a trilhar todo esse caminho. Foi o dia mais feliz de todo o ano de 2018. O livro é perfeito e todos eles têm um lugar especial em minha alma e no meu quarto também.

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O terceiro livro.
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O livro do álbum.

Um sonho dentro de um sonho


Em suma, sou um apaixonado por Edgar Allan Poe e sua escrita gótica e fenomenal. Há muito que se falar sobre os detalhes presentes em sua obra e em sua filosofia literária, mas o propósito desta publicação é simplesmente expor a minha história com o mestre do terror e pai do suspense policial. Foi uma longa história que se iniciou há mais de três anos. Entretanto, como vocês puderam perceber, todos os livros de que falei aqui são em português, o que nos leva à última peça que falta para completar minha coleção. Eu a vi também na Saraiva, numa época em que custava bem mais barato e estava bem mais abundante que hoje. The Complete Tales and Poems of Edgar Allan Poe.

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O livro final.
Todo o trabalho de Poe em um único livro, em seu idioma original. Todos os textos inalterados, com todas as palavras que o autor pretendeu usar. Algum dia, eu o encaixarei no espaço vazio que há na minha estante. Por agora, quero deixar meus agradecimentos a todas as pessoas que, mesmo sem querer, acabaram me fazendo encontrar este fenomenal escritor no qual me espelho. A Murilo, por me apresentar a banda que escuto até hoje; a Mariana, por ter me mostrado o livro da Darkside; a Nara, por expandir a minha coleção com os presentes. A todos vocês, o meu muito obrigado.

Poe teve uma vida difícil, morreu aos quarenta, já tendo perdido a mulher e a filha. Não tinha boas condições de vida, muito embora tenha tido bastante sucesso como poeta e editor literário. Constantemente falava ao mundo de sua tristeza, de seu luto, de sua solidão e de outros misteriosos tormentos dos quais jamais saberemos ao certo. Mas seu legado será lembrado durante vários anos, e sua escrita foi a melhor companhia que eu poderia ter nas incontáveis noites angustiantes que tive e suas palavras foram as mais incentivadoras que meu lado escritor poderia ter lido. Obrigado, sr. Poe. Foi um prazer conhecê-lo.

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